Como é hábito neste mês de abril, vira-se a página do calendário da vida do jornal. Abril, mês da esperança numa primavera renovada e da revolução, foi também o mês que viu nascer este jornal no ano de 1989. A partir daí, com energia, determinação e uma vontade férrea que pouquíssimas vezes esmoreceu, o projeto foi ultrapassando todas as dificuldades e consegue dobrar este mês o seu 33º aniversário, continuando a sua missão de informar a partir de Montemor.
Contudo, este não é um trabalho fácil. Felisbela Lopes sublinha que “aquilo que mais atormenta os jornalistas são os constrangimentos económicos. Estão aí as principais censuras, transportas na diminuição de meios, na redução das equipas, na limitação dos trabalhos. A dependência dos anunciantes é colossal. Hoje é difícil ir até ao fim da rua ou até ao fim do mundo à procura de uma boa história. Não há dinheiro.” Tanto nos grandes como nos pequenos jornais os constrangimentos são sérios e ameaçam de facto a sobrevivência destas empresas. Muitas vezes, não é que não exista vontade, mas se não existir financiamento, não é possível colocar estes projetos a funcionar.
Olhando para os dados publicados pela ERC em julho de 2021, os três distritos do Alentejo (Portalegre, Évora e Beja) tinham registos de 45 publicações, onde 19 eram on-line, 17 em suporte papel e nove publicações utilizavam o papel e o on-line. Contudo, dos 42 concelhos existentes nestes três distritos, apenas em 21 deles existe pelo menos um órgão de comunicação registado, o que significa que em 21 concelhos (50%) esta figura do jornal regional ou local já desapareceu do horizonte noticioso.
Mas nem tudo são más notícias. Um estudo recentre sobre os hábitos culturais sublinhava que “se os dados de 2007 apontavam o jornal como o objeto da cultura tipográfica com mais leitores em Portugal, o mesmo continua a verificar-se à luz dos dados deste Inquérito (43% dos portugueses com 15 ou mais anos leram jornais em papel no último ano).Também na esfera digital os jornais são a publicação mais lida (por 21% dos portugueses inquiridos), vindo só depois, a maior distância, os livros e as revistas (10% de leitores para ambos os suportes)”. O estudo acrescenta ainda que “é nas regiões Açores, Alentejo e Centro que se encontram mais adeptos da leitura de jornais regionais”.
Convém lembrar que, por extensão, a palavra jornal é derivada de ‘jour’, foi utilizada para designar o relato diário de acontecimentos e passou depois a definir toda e qualquer publicação periódica impressa. Assim, desde o início da sua existência que os jornais têm esta função de fazer o relato daquilo que acontece. Ora nas regiões do interior, esse papel só pode ser feito através dos jornais regionais e locais que estão próximos das populações. Os jornais nacionais apenas se interessam pelo que se passa no interior se aqui existir uma tragédia; caso contrário, o interior não será notícia sem a imprensa regional. É ela que vai aos acontecimentos que aqui existem, que os relata, que interroga os principais protagonistas e leva à primeira página quem se destaca nos mais variados assuntos. No fundo, os jornais locais são a voz de quem não tem voz; são o registo das pequenas coisas, são a interpretação da vontade de quem não vive nos grandes centros. “No nosso universo mediático, a expressão imprensa regional sempre foi sonante porque sugere de imediato um leque de pequenos jornais não diários, mais vocacionados para a história quotidiana das comunidades locais do que para o país ou o mundo. (…) Ainda hoje a missão da imprensa regional é a de «preservar valores culturais» embora ela tenha uma espécie de segunda missão ligada ao desenvolvimento das cidades”, refere Sofia Santos.
Fazer um jornal regional é uma hoje uma espécie de missão, mas para aqueles que têm participado neste projeto há mais de 30 anos, certamente que poucos se arrependeram da sua contribuição, qualquer que ela tenha sido. Judite Sousa menciona que “o jornalismo não conhece a rotina. Todos os dias o trabalho é diferente porque todos os dias os acontecimentos são diferentes. Não há duas realidades iguais, não há duas notícias iguais. O jornalismo proporciona-nos esta riqueza de vivências que nos deve fazer exigentes e mantermo-nos como os maiores críticos do nosso trabalho”. Miguel Esteves Cardoso, em entrevista ao jornal Expresso, publicada em novembro de 2020, sublinhava que fazer um jornal “é uma coisa maravilhosa, esse momento de produção, de criar, de escrever uma coisa em conjunto. Os jornais são coisas lindas! O grafismo, as palavras, a maneira como se escreve, o papel. Tudo é lindo nos jornais. Por isso temos de os defender”.
Neste momento de balanço onde se analisa um pouco do que foi o passado e se pensa em como projetar o futuro, resta agradecer a quem esteve connosco ajudando com os seus contributos e auxílios para que todos os meses centenas de pessoas possam ler o que aqui se tem passado e possam analisar e interpretar melhor a sociedade em que vivem. Como nos ensinou Arthur Miller, “um bom jornal é uma sociedade a falar com ela própria”.
A. M. Santos Nabo
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